quarta-feira, 3 de março de 2010

Um mentecapto...


"Última Crônica.
A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao
balcão. Na realidade estou adiando o momento de escrever.
A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito mais um
ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia
apenas recolher da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da
convivência, que a faz mais digna de ser vivida. Visava ao circunstancial, ao
episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina, quer nas
palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador
e perco a noção do essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo
meu café, enquanto o verso do poeta se repete na lembrança: "assim eu quereria o
meu último poema". Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último
olhar fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.
Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de sentar-se, numa das últimas
mesas de mármore ao longo da parede de espelhos. A compostura da humildade,
na contenção de gestos e palavras, deixa-se acrescentar pela presença de uma
negrinha de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre, que
se instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas curtas ou correr os
olhos grandes de curiosidade ao redor. Três seres esquivos que compõem em torno
à mesa a instituição tradicional da família, célula da sociedade. Vejo, porém, que se
preparam para algo mais que matar a fome.
Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro que discretamente retirou do
bolso, aborda o garçom, inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um
pedaço de bolo sob a redoma. A mãe limita-se a ficar olhando imóvel, vagamente
ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve, concentrado, o
pedido do homem e depois se afasta para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para
os lados, a reassegurar-se da naturalidade de sua presença ali. A meu lado o
garçom encaminha a ordem do freguês. O homem atrás do balcão apanha a porção
do bolo com a mão, larga-o no pratinho -- um bolo simples, amarelo-escuro, apenas
uma pequena fatia triangular.
A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho
que o garçom deixou à sua frente. Por que não começa a comer? Vejo que os três,
pai, mãe e filha, obedecem em torno à mesa um discreto ritual. A mãe remexe na
bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O pai se mune de uma
caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho.
Ninguém mais os observa além de mim.
São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta caprichosamente na fatia
do bolo. E enquanto ela serve a Coca-Cola, o pai risca o fósforo e acende as velas.
Como a um gesto ensaiado, a menininha repousa o queixo no mármore e sopra com
força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas, muito
compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se juntam, discretos:
"parabéns pra você, parabéns pra você..." Depois a mãe recolhe as velas, torna a
guardá-las na bolsa. A negrinha agarra finalmente o bolo com as duas mãos
sôfregas e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com ternura - ajeitalhe
a fitinha no cabelo crespo, limpa o farelo de bolo que lhe cai ao colo. O pai corre
os olhos pelo botequim, satisfeito, como a se convencer intimamente do sucesso da
celebração. Dá comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos se encontram, ele se
perturba, constrangido - vacila, ameaça abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o olhar e enfim se abre num sorriso.
Assim eu quereria minha última crônica:
que fosse pura como esse sorriso."
Fernando Sabino








Te querer faz de mim, muitas vezes, um mentecapto e sigo em busca dessas migalhas de um amor , essas que bastam existir para que se viva um banquete mitológico, para alimentar minha alma , para calar em meu roto peito essa saudade que explode em lágrimas , que em sorrisos amarelos se percebe a momentânea satisfação.
Quando te conheci percebi que amar só seria possível ,se fosse viceral , se rompesse meu coração em cada chegada e partida tua , se teu beijo... o primeiro...todos... criasse uma nova dimensão , se roubasse de mim o ar e o chão , se tirasse meu norte , se colocasse nesse querer a força de minha alma , ha mulher , ha menina converse com Deus , pergunte a ele o que tem sido meus dias , minhas horas sem você , e de certo dele ouvirá que tenho sido , no mínimo, um chato a implorar a intervenção divina para tanto descaso, um descuidado dilacerante cujo frio estanca em mim as muitas tentativas piegas de melhor atenção ...de migalhas .
Buscar fora de ti explicações para o amor ... buscar prazer até que intrínseco e meramente fisico é impossível e absolutamente impraticável ... como posso encontrar o sabor de teus beijos em outros lábios, como posso posso encontrar o brilho de teus olhos , o prazer de teu corpo ...como? Prefiro nem tentar comentar esse cruel engano , prefiro não magoar a nada e nem ninguém e principalmente se agisse na covardia de uma imediata substituição estaria a macular a essência desse amor , prefiro mil vezes a ter em sonhos que as vezes acontece nessa abstrata realidade quando de tua presença... fora disso a realidade é esse vagar de dias e horas , é essa constatação de vida onde não raro converso com estrelas minhas melhores companheiras nas infinitas solidões noturnas , se de dia apenas colho a melhor flor do jardim chamado... consideração na intenção de suavizar teus cotidianos afazeres .
Não raro penso em decretar tua , simbólica funérea partida , assim justificaria um estancar de tamanha e aflitiva paixão , penso em fechar essa porta , mas ainda mais rápido penso que mais fácil seria decretar minha absoluta insaniedade diante de tão insalubre possibilidade... se mesmo inquietante frente a tuas inadvertências minha vida conheceu ao teu lado os melhores sentimentos , dos piores fiz um trato com os céus ...deles faço adubo para melhor nutrir as rosas, muitas e coloridas com predominância das vermelhas e brancas , que ainda quero humildemente te ofertar ... antes viver de migalhas que não viver as possibilidades dos sonhos de ocupar um nobre lugar constante ao teu lado e deixar de ser um ...mentecapto... se migalhas mereço ...agradeço... delas surgem as forças que preciso para infinitamente te agradecer pelo melhor que hoje sou.

Paz , saúde e gratidão.

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